sábado, 4 de julho de 2009

Um olhar crítico sobre o fazer científico


ARTIGO


*Gustavo Santos

Por que falar sobre jornalismo científico? Por que divulgar ciência no Brasil? Antes de iniciar essa discussão, é importante responder a esses questionamentos. Dizer que esses temas são essências para o Brasil, é como se fosse falar algo sobre o senso comum, é a mesma coisa de dizer que a saúde, a educação e a economia são pontos relevantes para o desenvolvimento do país. O que importa é desmistificar esse tipo de informação, fazer com que ele saia do mundo acadêmico e científico e possa atingir o grande público.


O jornalismo científico é tema de grande importância para o mundo atual. O espaço para textos, artigos e comentários que envolvem ciência tem aumentado bastante no cenário nacional nos últimos anos. Quando se fala em jornalismo científico, muitas pessoas o confundem com divulgação científica. É importante, atentar para essas definições, pois jornalismo científico e divulgação científica não são a mesma coisa, embora estejam muito próximas. Elas são destinadas ao grande público, com a intenção de transmitir informação de pesquisa, inovação, ciência e tecnologia. Mas a divulgação científica se difere por não ser jornalístico. O jornalismo científico está relacionado à divulgação da ciência e tecnologia, através dos meios de comunicação, tendo por base os princípios jornalísticos. Então, é preciso ficar atento a esses dois conceitos, pois definem manifestações diversas de informações sobre ciência e tecnologia. Nem tudo que se fala sobre ciência, que está publicado em jornais ou revistas, poder ser considerado jornalismo.


Para exemplificar essa questão podemos destacar os fascículos sobre ciência e tecnologia que são inseridos em jornais, resultados de pesquisas, produzido por pesquisadores, mas que não possui um contexto jornalístico. Por isso, não se incluindo à categoria de jornalismo cientifico.
A disseminação científica é outro conceito também confundido. Voltada para um público específico, como especialistas e cientistas. Como exemplo, temos os cadernos de resenhas, voltados para os próprios pesquisadores.


O jornalismo científico brasileiro tem se profissionalizado nos últimos anos a partir, da contribuição das Universidades e Fundações de Apoio à Pesquisa (FAPs), que vêm promovendo o desenvolvimento desse segmento jornalístico, através de cursos, publicações e incentivo a pesquisa. A internet tem sido um espaço de muita utilidade para o desenvolvimento do jornalismo científico, com o surgimento de diversas revistas eletrônicas – é o caso do “O Jornal da Ciência”, que tem contribuído para a democratização da informação científica.


Atualmente, a maioria dos profissionais que divulgam ciência no Brasil estão ligados as faculdades de Comunicação Social. Por essa razão, é necessário o aprimoramento da formação do jornalista científico no âmbito universitário, procurando aperfeiçoar seus conhecimentos, diante de cursos, oficinas, especializações, mestrados e até mesmo doutorados. No Brasil já começa a surgir esse investimento no conhecimento sobre o jornalismo científico. Tendo em vista que a sociedade lhe exige, cada vez mais, um alto nível de profissionalização. É necessário aumentar e melhorar qualitativa e quantitativamente o volume e os conteúdos da informação especializada que chega ao público.


Além dessas questões discutidas, os jornalistas ainda sofrem com a alienação das empresas financiadoras de projetos. Devido ao aumento da complexidade dos projetos de pesquisa, surgi à necessidade de recursos para sua realização. Diante disso muitas empresas acabam se aproveitando para interesses comerciais. A ciência e a tecnologia são tratadas muitas vezes como mercadorias, estando à mercê do capital. Fazendo parte desta forma, de uma junção de interesses, políticos, econômicos, sociais e empresariais. Penalizando a qualidade da produção e divulgação científica.


O jornalismo científico no Brasil tem se difundido bastante. Não é necessário fazer uma análise muito profunda para constatar. Apoiados em alguns poucos indicadores, entre eles, uma política de descentralização do Governo Federal de investimentos em ciência e tecnologia para as regiões do Brasil, chegamos à conclusão que o jornalismo científico vive um avanço diante da sua trajetória histórica. As publicações especializadas na área têm aumentado, os cursos de especialização têm surgido nas universidades, podemos citar a da UFC em parceria com a FUNCAP e da UNICAMP, que já está bem estruturada, com possibilidades de se tornar um mestrado futuramente. Como também a criação do primeiro curso de especialização à distância em jornalismo científico, criando em 2007, na UNIVAP. Vários trabalhos de conclusão de curso têm falado sobre o processo da divulgação científica e sobre o jornalismo científico. Esta nova realidade irá propagar a ciência e tecnologia no Brasil, de forma mais coerente.


O Governo Federal, através do Mistério de Ciência e Tecnologia, as Fundações de Apoio à Pesquisa, as Universidades, Centros de Pesquisa e Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC), têm contribuído para a evolução deste segmento, auxiliando assim o desenvolvimento da divulgação científica. A ABJC já vem realizando a mais de 25 anos “O Congresso Brasileiro de Jornalismo Científico”, que é o evento mais importante da área em nosso país. Ele é promovido em dois e dois anos. Em 2007, o IX Congresso Brasileiro de Jornalismo Científico foi realizado na FAPESP em São Paulo e teve como tema central Jornalismo Científico e Sociedade: os novos desafios. Para o biênio 2009/2011 o X Congresso Brasileiro de Jornalismo Científico irá acontecer em Minas Gerais, durante o período de 14 a 16 de outubro, com o tema Jornalismo Científico e desenvolvimento sustentável. Esta edição contará com o apoio da FAPEMIG, que comemorará os 10 anos da sua revista Minas Faz Ciência, destinada à divulgação da ciência, tecnologia e inovação brasileira.


De acordo com Wilson da Costa Bueno, o jornalismo científico contribui para o processo de alfabetização científica, tornando-se uma função pedagógica, por parte dos jornalistas, que acabam democratizando a informação para o público. Ampliando assim a discussão sobre temas relevantes para a sociedade, relacionados à ciência e tecnologia.


Uma questão que ainda deve ser muito discutida, para uma melhor compreensão do jornalismo científico, seria a relação entre os cientistas/pesquisadores e os jornalistas/divulgadores. No Brasil ainda existe uma certa incompreensão, de quem faz e quem divulga ciência. Quando o pesquisador e jornalista passam a ter uma visão mais ampla e conseguem seguir um mesmo objetivo, essa produção cientifica, chega ao público com muito mais qualidade. É necessário reconhecer que não é fácil passar informações de temas não muito conhecidos pela população. Antes de qualquer coisa é preciso por parte da mídia, fazer com que as pessoas criem o habito pela leitura científica. É sobretudo, possível trazer temas complexos de ciência e tecnologia para o dia-a-dia das pessoas. Mas isso é possível através de talento e qualificação, como também, diante de pesquisadores e jornalistas que estão empenhados em cumprir com seu papel.


Um outro problema na produção do jornalismo científico é falta de capacitação do profissional que cobre ciência e tecnologia. Muitos profissionais ao se deparar com um pesquisador ou um especialista na área, acaba se intimidando e encarando tudo como fonte de verdade, como num processo de manipulação ou até mesmo de alienação por parte do pesquisador. É interessante pensar sempre além do entrevistado, para não se tornar apenas um porta voz do pesquisador.
Da forma que o jornalismo científico se desenvolve no Brasil percebe-se que ele ainda é um bebê em fase de crescimento. E para que esse bebê possa crescer é necessário que as escolas de comunicação, possam ter uma conscientização sobre a importância da qualificação de profissionais para exercer um trabalho de boa qualidade.


O jornalismo científico, além de ter a responsabilidade de democratizar a informação para a sociedade, está comprometido em alertar a população a ficar atento, a diversos problemas que acontecem no Brasil, como exemplo, a poluição dos rios, a extinção de animais, doenças que podem afetar a saúde da população, o cuidado com a flora e fauna. Trazendo benefícios à própria sociedade, evitando desta forma alguns problemas futuros.


Há muito tempo a ciência e a tecnologia deixou de ser algo apenas discutido a nível acadêmico e ganhou espaço diante da comunidade leiga. Com essa transformação o jornalismo cientifico ganhou respalde para o processo de produção e divulgação da ciência e tecnologia. Exigindo assim uma nova postura do jornalismo científico comprometido com uma concepção crítica da produção.


Um bom exemplo para representar o crescimento do jornalismo cientifico no Brasil, é o estado do Rio Grande do Norte. Durante os últimos cinco anos, a divulgação científica no estado tem aumentado de forma significativa. Esses dados podem ser comprovados através da iniciativa de instituições como UFRN, IFRN, UERN, UnP e a FAPERN de incentivar e desenvolver a ciência e tecnologia no estado. Está última é uma instituição de apoio à pesquisa que tem como objetivo principal apoiar e fomentar os programas ou projetos de pesquisa voltados à área da ciência, tecnologia e inovação realizadas em instituições públicas ou privadas.


O estado do Rio Grande do Norte tem se mostrado como referência no Nordeste, quando o assunto é jornalismo científico. A Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Norte se destaca nessa luta pela evolução do jornalismo científico no estado. A FAPERN tem desenvolvido iniciativas como o “Prêmio FAPERN de Jornalismo”, que tem como objetivo o reconhecimento e a visibilidade das matérias jornalísticas publicadas nos veículos de comunicação do RN que tenham como tema o desenvolvimento científico e tecnológico do estado.


Outra iniciativa de grande destaque realizada pela FAPERN, foi o Primeiro Curso de Jornalismo Científico no estado. Voltada para a capacitação de profissionais na área do jornalismo científico. Essas iniciativas têm colocado o RN em destaque no cenário nacional, tornando-se referência para outros estados.


As empresas de comunicação no RN, em destaque os jornais impressos, como, Diário de Natal, Tribuna do Norte, Jornal de Hoje, Correio da Tarde, O Mossoroense, Gazeta do Oeste, Jornal de Fato, JH 1ª Edição, fazem parte desse crescimento no cenário do jornalismo científico. Nesses dois últimos anos, o jornal impresso passou a divulgar muito mais ciência, absorvendo periodicamente matérias de conteúdo científico. E um dos motivos para esse acontecimento, foi sem dúvida alguma, a qualificação dos profissionais e o incentivo que as instituições do estado têm desenvolvido nos últimos anos. De acordo com dados disponibilizados pela assessoria de comunicação da FAPERN, a divulgação científica aumentou de forma significativa na mídia impressa.


A FAPERN vem popularizando a informação científica no RN, e um dos seus grandes aliados, tem sido a Revista Ciência Sempre que é um instrumento de divulgação que tem como objetivo publicar e comentar o resultado das pesquisas de ciência e tecnologia no estado.
Os outros tipos de mídia também estão fazendo parte desta construção, por exemplo, os sites e blogs, vêm disponibilizando mais uma alternativa para a divulgação científica.


No Nordeste, além do Rio Grande do Norte, Ceará e Pernambuco também vem se destacando na área. O estado do Ceará está bem adiantado na formação dos seus profissionais, com a implantação do curso de especialização em jornalismo científico, promovido pela UFC em parceira com a FUNCAP. Seguindo o mesmo caminho do RN e CE, o estado de Pernambuco está aperfeiçoando seus profissionais na área. No mês de outubro será realizado em Pernambuco, O Curso Ciência e Mídia – Curso de capacitação em Jornalismo Científico. O curso promoverá ferramentas para a reflexão sobre os mecanismos e processos de cobertura de temas de ciência e tecnologia pelos distintos meios de comunicação.


Na prática o Nordeste vem cumprindo uma função importante no processo da alfabetização científica, buscando favorecer o contato com o cidadão comum, com as informações e conceitos em ciência e tecnologia.


Apesar das diversas questões discutidas durante todo o texto sobre o fazer científico, suas contribuições e dificuldades na sua produção. Seria muito impertinente apenas apontar conceitos, dificuldades, contribuições e destaques. Algumas respostas também podem estar na relação com um problema real e presente, como a dificuldade crônica da pesquisa brasileira.
Talvez seja necessário partir para uma reflexão mais crítica, analisando todo o seu contexto. Algumas respostas com toda certeza estão escondidas num passado, um pouco distante até, mas com muitas histórias ainda a serem descobertas.


Com a revolução científica que vivemos, conhecida como a III Revolução Industrial, e a crescente globalização que vem ocorrendo no mundo. Fica aqui um grande questionamento, será que os jornalistas de hoje conseguirão ter uma qualificação profissional adequada, para acompanhar os diversos acontecimentos da ciência e tecnologia pelo mundo? Estarão eles, aptos a produzir jornalismo científico?

* Gustavo Santos é jornalista e historiador.
E-mail: gustavo.sfernandes@yahoo.com.br

Um comentário:

  1. Essa última questão é muito difícil de ser respondida! Ainda mais agora, com o diploma do curso superior de Jornalismo correndo o grande risco de ser, de certa forma, rebaixado por ser igualado ao certificado de um curso técnico na área.
    Também tenho cá minhas dúvidas se os profissionais de hoje estão capacitados para fornecer informações à população, até porque, fica difícil saber se estes profissionais conseguem entender o que querem passar adiante ou não.

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